INEM, Saúde, Educação, Segurança, Justiça e as Outras Tragédias Nacionais


INEM, Saúde, Educação, Segurança, Justiça e as Outras Tragédias Nacionais
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INEM, Saúde, Educação, Segurança, Justiça e as Outras Tragédias Nacionais



Portugal é, talvez, o único país do mundo onde o maior problema não é a falta de serviços, mas a absoluta abundância de desculpas. Ora vejamos: o INEM, esse baluarte da emergência, devia garantir que todos nós teríamos uma ambulância a caminho ao mínimo toque de azar. Mas o que acontece? Telefonamos e, como é natural, nada. No final, claro, a culpa nunca é deles – é das estradas, do trânsito, do calor, da chuva, dos outros.


Em tempo de paz militar, o INEM é a última linha de defesa de um país que, ironicamente, insiste em não saber onde começa a linha. Num cenário perfeito – onde viveríamos todos sem dores, acidentados, ou urgências – talvez nem precisássemos do INEM, mas em Portugal temos uma coisa ainda mais próxima da ficção científica: a crença de que ele funciona. 


Portugal: Um País Pequeno, Uma Incompetência Gigante


É quase poético, aliás, que um país com a população de uma cidade média europeia tente levar-se tão a sério como nação e, ao mesmo tempo, seja incapaz de dar resposta a uma simples emergência. 

O INEM não consegue atender a tempo, o sistema de saúde não tem camas, hospitais ou profissionais, as escolas caem aos pedaços, as estradas são quase intransitáveis e o que é que se pode fazer? Porque é que nada muda? A resposta é a de sempre: "isto é Portugal".

De todas as calamidades, a saúde pública é talvez a mais evidente. No dia em que finalmente “apanhamos” o INEM a horas, entramos num hospital onde nos deixam dias a fio no corredor – o próprio purgatório lusitano. 

O país tem, em teoria, tudo o que qualquer país “a sério” deveria ter: hospitais, escolas, estradas, serviços de emergência… só que, na prática, as pessoas ligam para o 112, e o atendimento é capaz de demorar tanto que se transformam num número a mais para as estatísticas de resposta tardia. E a ironia nisto é gritante: Portugal é mais pequeno do que Londres, menos populoso do que São Paulo, e ainda assim, incapaz de coordenar um simples serviço público com eficácia.


Quando um País de Dez Milhões Funciona Pior que uma Cidade


A questão da população é essencial. Portugal tem pouco mais de dez milhões de almas, mas opera com a pompa de um país de cinquenta ou cem milhões. Londres, uma única cidade, tem mais gente do que Portugal inteiro, e consegue, de alguma forma, fazer as coisas funcionar. Isto diz mais sobre a nossa ineficiência estrutural do que sobre qualquer “excesso de trabalho” ou “falta de recursos”. Porque no fundo, aqui tudo se resolve com um empurrão, uma cunha, ou uma desculpa que faça a roda andar – até que, claro, alguém precise de algo básico como… uma ambulância.

A população até aceita tudo isto com um estoicismo verdadeiramente notável. Porque o português aprendeu, há muito tempo, a não esperar nada do Estado. Para quê? Quando um cidadão se atreve a pedir algo que o Estado “oferece” – como saúde ou educação, imagine-se o luxo! – encontra apenas um Estado mastodôntico que nos tira até à última gota de impostos e dá em troca uma sala de espera cheia, um corredor de hospital com vista para a falta de camas, ou, claro, a mesma promessa eterna de “investimento” que nunca chega.


A Carga Fiscal Pesada e o Serviço Público de Papelão


E como ignorar a cereja em cima do bolo, a carga fiscal? Porque se há uma coisa que o Estado sabe fazer com eficiência é cobrar impostos. Exigir pagamento, obrigar a contribuições, cobrar taxas e criar a miragem de um retorno que não existe. 

Porque é que ninguém questiona que pagamos tanto e recebemos tão pouco? Na saúde, é um drama. Na educação, uma piada. Na segurança, um escândalo. Na justiça nem se fala. E em termos de planeamento, uma metáfora perfeita do país inteiro: tudo improvisado, sem plano a médio ou longo prazo, confiando que talvez alguém deite mão ao assunto e, se não der, o próximo governo que se desenrasque.

Portugal é especialista em dizer que “não há dinheiro”, enquanto cria impostos de tudo e mais alguma coisa. Dizem que “não há médicos”, mas há sempre filas intermináveis para pagar a nossa dignidade. Dizem que “não há professores”, mas há sempre dinheiro para consultorias e para um qualquer “plano nacional” – que é, quase sempre, a tradução do próximo atraso ou o estudo que nos vai explicar, uma vez mais, porque é que isto não funciona. E o português já está vacinado contra estas promessas, claro. Só a imunidade contra o cinismo nos mantém vivos.


Entre o Cinismo e a Comédia: Portugal, Um País de Desculpas


Cada área relevante para a dignidade do país está transformada numa triste paródia de si mesma. Se o Ministério da Saúde é um circo de horas de espera, o Ministério da Educação é um espetáculo de decibéis descontrolados, professores desmotivados e alunos que aprendem só o básico para escapar com um canudo. A tutela das Obras Públicas faz rotundas onde não há trânsito e pontes onde não há rio. E o Ministério da Segurança Social só parece seguro para quem está atrás do guiché, porque quem está à frente sabe que é preciso um diploma em burocracia para tratar seja do que for. No Ministério da Justiça, impera a injustiça. Cada ministério parece competir numa corrida de incompetências, onde o verdadeiro prémio é saber que, apesar de tudo, continuamos a pagar.

O pior disto tudo? O Estado cobra-nos como se fosse a Suécia, com impostos que fariam corar os cidadãos dinamarqueses, e entrega-nos um serviço que faria, quem sabe, até a Albânia protestar. Mas aqui, nada. Pagamos para uma saúde pública que não chega, para uma educação pública que não ensina, e para uma segurança pública que… (ficam as reticencias, dizem mais que palavas). Tudo o que o Estado nos promete está embrulhado numa ilusão. Somos uma miragem de eficiência, onde os papéis vão e vêm, os estudos continuam a estudar e, no fim, a única coisa que avança são as derrapagens financeiras, os prazos e as promessas.


Pequeno País, Grandes Problemas: A Máquina do Estado Português


E cá estamos nós, num país com a população de uma cidade, atolados num pântano de desculpas e numa ilusão que o governo insiste em alimentar. E quem paga? Pagamos todos, claro. E pagamos caro, todos os meses, para sustentar a máquina de um Estado que nunca vai ao sítio.

Quando uma nação minúscula como a nossa não consegue coordenar os seus serviços essenciais, só nos resta a conclusão óbvia: Portugal é uma comédia nacional com impostos de país sério. Uma cidade disfarçada de país, onde fingimos que o Estado existe para nos proteger, quando o seu verdadeiro papel é colecionar o nosso dinheiro enquanto perpetua o caos com um toque de arte barroca.

Paulo Brites
2024.11.08


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