A Minhoca na Castanha: Liberdade, Inclusão e Outros Bichos
A Minhoca na Castanha: Liberdade, Inclusão e Outros Bichos |
As redes sociais são um espetáculo. Num único dia, vemos a guerra e a paz, o amor e o ódio, e até as castanhas e as minhocas. Sim, porque até uma castanha assada tem agora o poder de ofender. Nem a boa e velha metáfora visual de uma castanha – esse símbolo português, universalmente inofensivo – escapou à fúria da inclusão seletiva.
Basta um pequeno meme, uma piada entre amigos virtuais, a lembrar-nos de um facto da vida simples: às vezes, ao descascar uma castanha, encontramos uma surpresa lá dentro. Às vezes uma castanha tem uma minhoca. Acontece. É só uma questão de estatística e biologia.
Do Humor à Heresia
Mas eis que, nas redes sociais, alguém vê logo ali a metáfora da ofensa. Esse alguém, naturalmente, alega que é preciso “cuidado” – e com este "cuidado" vem toda uma espécie de censura pré-aprovada. Claro que sim, porque a liberdade de expressão só é válida quando inclui a liberdade de concordar. Todos podem dizer o que pensam, desde que seja o mesmo que eu penso.
E é assim que nos vemos, de repente, num mundo onde o humor, a crítica e até o bom senso têm de passar primeiro pela comissão da inclusão: uma máquina de vigilância moral que confunde piada com insulto, metáfora com injúria e que defende, com unhas e dentes, que devemos viver num mundo onde todos aceitam tudo, desde que seja precisamente aquilo que eles acreditam.
A Inclusão que Exclui
Agora, peguemos no exemplo das castanhas. A brincadeira sobre a “minhoca na castanha” passa, então, a ser vista como algo mais que uma simples piada. Tornou-se, imagine-se, um potencial insulto. E, no fim, fica o sermão de que esta “piada” está a perpetuar um sistema de opressão e ignorância qualquer. Porque, agora, um simples escorregão humorístico é sinónimo de ignorância total sobre as sensibilidades do outro. Isto é, o humor está para o novo século como a peste negra estava para a Idade Média. Tudo o que é divertido tem um problema embutido: ou é sexista, ou é homofóbico, ou é, pura e simplesmente, contra o “bem comum”.
E depois ainda se faz este curioso pedido de “inclusão”. Uma palavra linda, carinhosa, de braços abertos. Mas que significa, basicamente, a obrigatoriedade de que eu inclua aquilo em que eles acreditam, sem discutir. Liberdade, sim – mas é para ser exercida da forma certa. A “inclusão” neste caso passa a ser uma forma de exclusão camuflada, onde se exige tolerância aos que sempre foram tolerantes, mas nunca aos outros.
No final do dia, o que temos não é igualdade, mas uma espécie de religião nova, que prega dogmas da aceitação, com tanto ou mais zelo do que qualquer clérigo medieval a gritar: queimar os hereges na praça central. E tudo porque alguém brincou com uma castanha e uma minhoca. Que absurdo.
Paulo Brites
2024.11.14
Atualidade - Opinião
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